Era uma vez uma pequena
princesa indiana chamada Sara.
Assim como sua mãe havia
lhe ensinado todos os dias, ela orava a Deus olhando o sol, as plantas, os
animais e, principalmente, as pessoas de seu vilarejo. Todos os dias ela vestia
seu melhor sare acompanhado por muitas joias e flores no cabelo longo. Todos os
dias ela preparava os mais deliciosos quitutes, doces e chás para sempre ouvir
o pai dizer: “Como eu te amo minha filha, você foi o melhor presente que sua mãe
me deixou e se um dia eu morrer como ela, eu tenho a certeza que você já sabe
se cuidar. Pois nascemos e morremos sós”.
No começo Sara ficava
emburrada, mas depois ia abrindo um sorriso franco para as palavras do pai,
afinal ninguém pode transpor os ciclos das reencarnações sem passar pela morte.
Um dia, a guerra chegou
avassaladora e levou todos os homens. As mulheres choravam muito e as crianças
também pelas duvidas de um novo alvorecer.
Ao entardecer dos dias
que se seguiram, mentes e corações sempre se uniam com as preces para um mundo
em paz.
Demorou um pouco, a paz
retornou, mas trouxe consigo com a escravidão, poucos homens
sobraram, as mulheres e as crianças foram levadas sem grilhões e amarras, todos
guiados por caravanas e depois uns poucos barcos.
Alguns dias de viagem, um
novo horizonte, outra margem, um velho vento e os mesmos murmurinhos.
Uma menina da mesma idade
de Sara invadiu o escale, deu lhe uma rosa branca e partiu. Era um sinal de
muita sorte e Sara agradeceu a Deus, se ajoelhando e orando forte e
silenciosamente não só por si, mas por todos ali.
Uns poucos instantes
depois, a menina que trouxe esperança a Sara, trouxe consigo seu pai, Sara lhe
deu uma pulseira linda tirada do pulso esquerdo e os três foram para Magdala.
De longe Sara foi se
despedindo observando bem as águas do rio Nilo, os verdes papiros, os barcos e
seus vizinhos de infância. Sara caminhava vitoriosamente sorrindo, pois Deus
voltava a sorrir sorte para seu povo e principalmente para o seu futuro. A
outra menina também sentia o mesmo, seu nome é Maria Madalena.
Em Magdala, não havia uma
só pessoa que não falasse que Sara e Maria Madalena não eram irmãs. O pai de
Maria não deixava que fosse feito de outra forma. Elas recebiam os mesmos
cuidados, carinhos, tarefas, disciplinas e respeito.
Na casa de Maria Madalena
não havia escravos, mas sim funcionários que trabalhavam e por isso tinham um
salário no fim de cada mês. E eles independente de qualquer coisa sempre
ajudavam os próximos.
Infelizmente, tudo muda e
o dinheiro também. O querido pai morreu deixando algumas dívidas.
Sara e Maria Madalena
vendem as joias e as propriedades na esperança de dias melhores. Ambas estão
pobres e determinadas. Ambas lutam. Ambas vencem. Ambas continuam ajudando os
menos afortunados.
Desabrocham rapidamente.
Madalena se prostitui e Sara sai fazendo trocas e barganhas. E o que haviam
perdido ganham em dobro.
Uma noite, surgi à
luxuosa porta uma leprosa curada, agradecendo uma moeda dada com amor no meio
do caminho por Madalena, ela conta que o Nazareno está a poucos metros dali.
Ambas se olham, Sara cobre Maria Madalena e elas vão encontrar o Rabino.
Chegando lá, Ele as
recebe de braços abertos. Madalena chora muito pedindo perdão pelo
rumo que deu á sua vida. Sara traz uma jarra de azeite.
Madalena lava os pés de Jesus com as lagrimas e seca com os longos cabelos.
Sara abençoa Jesus urgindo-o com azeite na testa.
Maria Madalena torna-se um dos três discípulos
a receber ensinamentos especiais, elogiada acima de Mateus e Tomé. Dizia-se que
"ela falava como mulher que conhecia o Todo". E Sara continua sempre
ao seu lado dando apoio, ouvindo conselhos e conciliando.
Mais tarde, Sara admite a
Jesus que não ousa falar a ele livremente porque, segundo suas palavras:
"Pedro faz-me vacilar, tenho medo dele porque ele repudia as criaturas
femininas". Jesus responde que quem quer que o espírito tenha inspirado é
divinamente ordenado a falar, seja homem ou mulher. Sara e Maria Madalena
começam operar milagres.
Ambas seguem Jesus até o
fim. Mesmo quando são jogadas ao mar numa barca sem remos, sem velas e sem
provisões com Maria Jacobé, Maria Salomé, José de Arimatéia e Trofino. Mesmo
quando caem as primeiras gotas espessas de chuva. Mesmo quando a tempestade
confundi o alto mar e as nuvens negras. Mesmo quando as ondas jogam a nau mais
longe e mais perto de virar. Todos se desesperam e choram muito.
Sara retira o lenço
(diklô) da cabeça, chamando por Jesus e promete que se todos se salvassem, ela
jamais andara com a cabeça descoberta em sinal de respeito. Todos dão as mãos e
oram fervorosamente.
Milagrosamente, a barca
sem rumo aporta em Laquedor (sul da França) e Sara cumpri a promessa até o
final dos seus dias, quando é encontrada morta pelos ciganos nas ondas
primaveras de Saintes-Maries-de-La-Mer em 24 de maio, com sua cabeça e seus
cabelos cobertos pelo lenço e sua fé.
Jorge Barboza
Escritor e Colunista Social
(Este texto foi publicado este ano no livro "Entrefotos Cultura Cigana" de minha grande amiga Fatima Bessa, que você pode adquirir em: https://clubedeautores.com.br/book/204592--Entrefotos_Cultura_Cigana)
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